O livro Experiência e Hermenêutica Pentecostal: reflexões e propostas para a construção de uma identidade teológica, de autoria dos Professores David Mesquiati e Kenner Terra, obra que foi publicada pela Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD), de algum modo contribuiu para evidenciar a intolerância de uma parte expressiva do Pentecostalismo. O livro provocou muitas reações e algumas até agressivas, que pareciam ser de cunho pessoal. Ouvi dizer que a CPAD teria até retirado o livro de circulação dados os muitos protestos.
Pude ler alguns artigos e também diversos comentários no Facebook que atacaram duramente a publicação. Mas, honestamente falando, a meu ver essas abordagens só evidenciam o despreparo de algumas pessoas e também o seu preconceito com alguma proposta que foge aos seus cânones. Infelizmente, alguns autores que publicam em sites populares (isto não é demérito algum) estão refletindo sobre questões que eles mesmos não conhecem a fundo. Produzem-se afirmações sem real conhecimento do que se pretende criticar.
Para exemplificar, veja o absurdo que o autor do artigo intitulado "Teologia da experiência" não é teologia pentecostal escreveu, no Gospel Prime: "Em termos comuns, é claro que a responsabilidade humana é construída por experiências, e que o que o profeta [Oséias] vivenciou pode ser caracterizado como tal, mas - atenção! - com isto se constata que o conceito de experiência para essa abordagem teológica ultrapassa os contornos da pneumatologia e avança ao campo do existencialismo" (ESTEVES, Alex. "Teologia da experiência" não é teologia pentecostal. Disponível em: <https://www.gospelprime.com.br/teologia-da-experiencia-nao…/> Acesso em 04 nov. 2019).
Concluir que determinado autor está dialogando com o existencialismo a partir de uma citação pontual que ele fez de uma passagem veterotestamentária que envolve uma experiência vivida por um profeta, neste caso Oséias, evidencia que não se tem a menor ideia do que seja o existencialismo na Filosofia. A conexão que o autor do artigo no Gospel Prime estabelece para justificar o uso do existencialismo é completamente imprópria. Kierkegaard e Heidegger devem estar se revirando no túmulo...
Vi levantar-se uma verdadeira "intifada" contra o que tem sido chamado de "Teologia acadêmica", em que muitos clichês e preconceitos são destilados. Os proponentes dessa caçada a teólogos acadêmicos, em meu entendimento, vem produzindo um desserviço na medida em que criticam um contexto que eles mesmos não conhecem. É gente que nem passou pela Academia Teológica e alguns que nem formação teológica possuem criticando quem está pesquisando e produzindo no campo da Teologia. Noutras palavras, não possuem real conhecimento de causa, mas atacam como se tivessem propriedade no assunto.
O "povão", naturalmente, compra sua crítica. E no mais, por mais que discordemos dos resultados da pesquisa de Mesquiati e Terra, o que eles estão fazendo (a metodologia) não é em nada inovadora. Estabelecer diálogo com alguma corrente de pensamento específica não é algo que tenha sido inventado agora pelos referidos autores. Barth, Bultmann e Tillich fizeram isso no passado. O uso do Método Histórico-Crítico? Fala sério! Diversos comentaristas pentecostais dialogam com ele. Quanta imperícia daqueles que criticam o uso do Método Histórico-Crítico por autores pentecostais... Ou hipocrisia...
Particularmente, não gostei da proposta de Mesquiati e de Terra em seu livro, mas nem por isso vou produzir ataques sobre uma proposta que eu mesmo não conheci a fundo e me fechar a uma nova possibilidade no campo da pesquisa teológica. O que esses "xiitas pentecostais" não entendem é que diálogo não necessariamente implica ruptura. Lamento muito esse tipo de inflexibilidade e intolerância em nosso contexto pentecostal.
É preciso entender uma verdade: uma Teologia que não dialoga e não se abre à revisões não é Teologia coerente e sensível às realidades de nosso tempo. É apenas uma teologia arrogante e ensimesmada. O Método Histórico-Gramatical, que eu, na condição de estudante e não de exegeta, aprecio e utilizo, é obsoleto e possui deficiências. Enquanto isso, o Método Histórico-Crítico, tão detestado por "nós", prossegue trazendo à lume novas contribuições e abrindo caminho para a Exegese. Você duvida? Compare o Comentário Bíblico Beacon com o Comentário Bíblico São Jerônimo. E este é só um exemplo.
É lamentável esse tipo de rigidez que temos visto e até presenciado no Pentecostalismo e por vezes percebida em artigos e vídeos. No fundo, o que todo esse zelo pela "ortodoxia doutrinária" traz à tona são interesses políticos, econômicos (já que alguns desses "ortodoxos" divulgam instituições de cursos livres não acadêmicos) e ainda, a intolerância para com quem pensa diferente.
(Observação: este artigo foi originalmente publicado em meu Blog Fundamentos Inabaláveis, em 08 de novembro de 2019).
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