Por Roney Cozzer, teólogo e psicanalista.
Sempre busco manter fixa na minha mente o fato de que analisar um movimento como o evangélico requer sempre considerar que ele é amplo e multifacetado. E que nele há muita gente boa e que de fato segue o ensino de Jesus na vida. Sou testemunha ocular disto! E eu mesmo, quando era evangélico, buscava viver assim. Por isto mesmo, ter isso em mente, para mim, é questão de honestidade intelectual.
Todavia, mesmo reconhecendo isto, não é exagero falar de uma espiritualidade e de uma cultura religiosa que definem esse movimento. Uma tendência geral. E essa cultura religiosa é atravessa por diversas características, sobre as quais eu refleti durante anos até decidir pela ruptura definitiva com o movimento. Entendi que ser evangélico é ser reconhecido por essas características, mas o cristão e o ser humano que me tornei não condiziam com essas marcas.
E tenho gratidão a Deus e orgulho de mim por isto!
Uma dessas características que define a espiritualidade evangélica é a sua notada - e chocante! - perversidade e insensibilidade religiosa. O Rio Grande do Sul ainda se recupera daquela que, bem provavelmente, seja a sua maior tragédia histórica, mas uma grande parcela da comunidade evangélica segue crendo e afirmando que essa tragédia é juízo de Deus sobre aquele Estado, sobretudo pelo fato dele abrigar terreiros e espaços de culto das religiões afro. O que revela também a intolerância religiosa desse segmento. Mas o pensamento de quem entendeu o evangelho, num momento assim, deveria ser de empatia, de solidariedade e de amor.
Outra marca dessa espiritualidade é a visão que ele tem de Deus: um Deus punitivo, iracundo e vingativo, bem diferente do Deus de Jesus Cristo. São esses mesmo evangélicos que bancam um projeto de Lei abjeto como o PL 1904/2024, mas defendem a torto e a direito a ideia de que "bandido bom é bandido morto". Ora, a vida de um adulto vale menos então que a vida de um feto? São esses mesmos evangélicos que vão para a porta de um hospital protestar contra o fato de uma menina de 11 anos ter feito aborto, a qual era violentada desde os seis, ao invés de se unirem para prestarem assistência espiritual e material à ela e à sua família.
É surreal o que esse movimento se tornou! Uma mistura de burrice, intolerância, incivilidade e violência simbólica "em nome de Deus"...
Sim! Essa espiritualidade é uma espiritualidade doentia!
Quando digo que os evangélicos, muitas vezes, se colocam na contramão de valores civilizatórios, algumas pessoas se chocam comigo. Mas momentos como esses que estamos vivendo, como os que mencionei acima, confirmam isso. Meus textos e falas partem de alguém que viveu muito tempo lá dentro. Não sou um garoto que ficou aborrecido com um puxão de orelha de um pastor e saiu da igreja, como pensam muitos a meu respeito. Minha recusa a essa espiritualidade é fruto de anos de reflexão, de conhecimento do interior do movimento e de ter visto e ouvido muita coisa.
De cá, sigo!
Em paz com Deus e com minha consciência.
Tenho sim minhas questões a resolver, mas prossigo buscando me melhorar e não me permitindo - não mais! - à exposição a essa espiritualidade e aos seus discursos. Por essas aberrações e tantas outras, o ambiente evangélico tornou-se insuportável para mim.
Há um caminho melhor que o dessa religião: aprender aos pés de Jesus, seguir seu exemplo, ler a Bíblia, praticar seus ensinos, amar o próximo e buscar contribuir com a sociedade usando o melhor que temos e que podemos fazer.

Caro Roney, tenho lido seus livros e louvo a Deus. Estive lendo sobre sua postagem e seu desligamento da igreja. Sou engenheiro, Teólogo, escritor e Pastor membro da Igreja Batista Boas Novas em SP a 9 anos. Entendo sua frustação em relação aos evangélicos pois passei em poucas igrejas após minha conversão aos 39 vindo da igreja católica e concordo com suas considerações visto que hoje temos muita religiosidade e vaidade dentro de nossas igrejas. Mas tudo isto é porque as igrejas são feitas de pessoas com falhas. Me vi muito tempo pensando em deixar também e seguir como você, mas entendi de Deus que deveria estar dentro para ajudar vidas a mudar este contexto mesmo entre colegas de ministério que não me veem com bons olhos, pois não aceitam criticas e sequer existe liberdade de expormos nossas posições. É dificil pois temos igrejas com lideranças também problemáticas e autoritárias além da independencia entre as mesmas. Não querendo alongar muito eu decidi permanecer na igreja dita evangélica batista mesmo com seus inumeros defeitos pois além da comunhão com muitos irmãos, louvor a Deus ainda tenho a oportunidade de exercer meus dons e talentos para ajudar a mudar no contexto que você descreve. Sabemos o quão dificil é mudar e ajudar pessoas a escolher os caminhos de Deus , talves sua saida também se somou a falhas de um lider com muita espiritualidade mas todos seremos julgados. Se eu pudesse deixar uma reflexão, seria o de voltar a uma igreja evangélica que busca com seriedade seguir a Palavra de Deus mas continua com suas falhas e assim você ajudaria com os seus dons e talentos a completar a obra que Deus colocou sobre você.
ResponderExcluirFinalizando e olhando para sua ultima frase, sempre houve o caminho melhor para qualquer religião: amar a Deus sobre todas as coisas e amar o seu próximo "com todos os defeitos", realmente aprender aos pés de Jesus sendo um exemplo no meio daqueles que ainda são religiosos ou pecadores como Jesus o fez, ler a Bíblia, contribuir com a sociedade (aqui incluo estar inserido na igreja que está doente e precisa de pessoas à frente de seu tempo e alinhada com Deus para mostar as falhas), tudo isto lhe foi concedido, não abandone os evangélicos mesmo diante de tanta indignação. Grande abraço e que Deus continue lhe dando sabedoria para escrever ao povo de Deus.
Cirúrgico nas palavras! Como católico não vou ser hipócrita de dizer que concordo com 100% de tudo! Mas foi um excelente ponto de vista e opinião sobre esse lado! Gostei muito e me identifiquei em partes com sua linha de raciocínio! Deus abençoe, nobre!
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