TEXTO BÍBLICO BASE:
"Filipe correu e ouviu que o homem lia o profeta Isaías; e perguntou: Entendes o que estás lendo?" (Atos 8.30, Almeida Século 21).
INTRODUÇÃO
A Hermenêutica, teológica e não teológica, é um ramo do conhecimento essencial para as Ciências Humanas. Ela precisa ser levada em conta no estudo de outras disciplinas, o que permite assim um estudo que seja feito em perspectiva transdisciplinar. Isso contribui para produzir conhecimento que seja mais coerente e abrangente.
A relação da Hermenêutica Bíblica com o assunto das profecias bíblicas de teor escatológico é atual e muito relevante. As afirmações escatológicas que são feitas pela Igreja precisam ser sustentadas por aparato hermenêutico, de modo que se produza uma reflexão escatológica mais coerentes, sensatas e sobretudo, bíblicas de fato.
As duas disciplinas - Hermenêutica e Escatologia - precisam dialogar. O estudo e a compreensão de textos bíblicos escatológicos precisam levar em conta princípios hermenêuticos diversos, que colaboram para uma interpretação que permite uma aproximação do sentido original, aquele que foi pretendido pelo hagiógrafo.
1. DEFINIÇÃO E UTILIDADE DA HERMENÊUTICA
A Hermenêutica pode ser definida como ciência e Arte da interpretação bíblica. Ela também oferece uma série de princípios interpretativos que contribuem para assegurar uma compreensão mais coerente do texto bíblico.
A Hermenêutica também é entendida em termos filosóficos, como uma disciplina filosófica. E neste caso, vários pensadores deram a sua contribuição. Comentando o pensamento hermenêutico do filósofo francês Paul Ricoeur (1913-2005), Moisés Silva e Walter Kaiser Jr. (2002) afirmam o seguinte: "O trabalho de Paul Ricoeur é especialmente conhecido nesse sentido. Entre suas inúmeras ideias sugestivas, devemos notar sua ênfase na distinção das relações entre falar-ouvir e escrever-ler. No discurso oral, o sentido do discurso se sobrepõe à intenção do orador. “Dentro do discurso escrito, porém, a intenção do autor e o sentido do texto deixam de coincidir [...] o rumo do texto deixa escapar o horizonte finito vivido por seu autor. O que o texto significa agora é mais importante do que a intenção do autor quando escreveu” (Paul Ricoeur. Interpretation Theory: Discourse and the Surplus of Meaning (Fort Worth: Texas Christian University, 1976, p. 29-30). Embora o próprio Ricoeur não fosse um estudioso da Bíblia, ele estava profundamente interessado no pensamento religioso e, portanto, muitos teólogos e estudantes da Bíblia tem sido influenciados pelo seu trabalho" (SILVA. KAISER, 2002, p. 225).
2. DEFINIÇÃO E UTILIDADE DA ESCATOLOGIA
A Escatologia cristã tem sido tradicionalmente definida como a "doutrina das últimas coisas": "O substantivo escatos significa “último” e unido ao vocábulo logos, “palavra”, trazendo assim o sentido de “estudo das últimas coisas”. Escatologia, portanto, é a disciplina que se debruça sobre as profecias e os escritos acerca dos fins dos tempos" (COZZER. HENRIQUE, 2021).
A Escatologia pode ser individual ou cósmica. A individual é aquela que trata do destino individual do homem e inclui temas como a morte, estado intermediário dos mortos e ressurreição. A Escatologia também pode ser cósmica, que trata do destino da humanidade e do próprio universo.
A Escatologia deve ser definida ainda como uma compreensão cristã a respeito do futuro com implicações no presente. Dito de outra forma, a Escatologia nos oferece explicações e compreensões a respeito do futuro que nos levam a assumir posturas no hoje, na realidade da vida cotidiana. Por exemplo, a convicção de que Cristo voltará infunde nos cristãos esperança e zelo pela vida espiritual.
A Escatologia é uma disciplina teológica muito importante, não apenas para a Teologia Sistemática, mas para a Teologia de modo geral. Infelizmente, ela vem sofrendo banalizações ridículas! Mas a sua utilidade prática é muito concreta e plausível: produz esperança; vivifica a espiritualidade; chama à ação no mundo da vida e ao discipulado cristão.
3. TRANSDISCIPLINARIDADE EM TEOLOGIA
- "Pensar uma disciplina teológica em termos de transdisciplinaridade significa, em nosso entendimento, pensar uma teologia que seja bíblica e ortodoxa, mas não unívoca e ensimesmada" (COZZER. HENRIQUE, 2021);
- "A transdisciplinaridade pensada em relação a uma disciplina teológica ou mesmo em relação a própria Teologia como uma área de conhecimento bem ampla, implica pensar um conhecimento teológico que é articulado em interação com outras disciplinas, de outras áreas" (COZZER. HENRIQUE, 2021);
- "[...] a transdisciplinaridade indica o percurso entre campos do saber, e esse percurso não deixa de ser lógico e organizado; a ideia de transdisciplinaridade “rompe”, de certo modo, com o conceito de disciplina e busca assim construir o conhecimento de modo mais integrado, não atomizado e não compartimentalizado. Deve-se lembrar que o prefixo trans aponta justamente para o percurso entre ou através das disciplinas, unificando assim o conhecimento" (COZZER. HENRIQUE, 2021).
CONCLUSÃO
Tenho defendido (verbalmente e pela escrita) que a Hermenêutica Bíblica não só pode, como deve ser “transposta” da Academia Teológica para a vida prática da Igreja. Noutras palavras, meu entendimento é que ela não deve ser apenas uma disciplina restrita, ou “confinada” à Academia Teológica, mas pensada e articulada para a vida prática da Ekklesia. Se isso não acontece, em relação à Hermenêutica Bíblica, ela será reduzida apenas a um esforço acadêmico que se ocupa de interpretar um texto antigo, e não o esforço de interpretar um texto antigo cujos resultados da interpretação são aplicáveis à vida comunitária da fé.
REFERÊNCIAS
COZZER, Roney Ricardo. HENRIQUE, Samuel Cândido. Escatologia Bíblica numa perspectiva transdisciplinar: uma análise das escolas escatológicas, da Hermenêutica, da História, da Teologia Bíblica e como a interpretação escatológica influencia a Igreja em sua ação missional. São Paulo: Fonte Editorial, 2021.
SILVA, Moisés. KAISER Jr, Walter C. Introdução à Hermenêutica Bíblica: como ouvir a Palavra de Deus apesar dos ruídos de nossa época. Trad.: Paulo César Nunes dos Santos. Tarcízio José Freitas de Carvalho e Suzana Klassen. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2002.
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