segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Escolas de interpretação escatológica

 

Existem três linhas ou escolas de interpretação da doutrina das últimas coisas que são comumente estudadas entre os evangélicos. É interessante notar que embora o século XX tenha presenciado um crescente interesse pela Escatologia Bíblica, já antes, na Idade Média, muitos conceitos escatológicos que hoje se professam, já eram aceitos pelos cristãos daquela época.

Os cinco primeiros séculos da Igreja não se caracterizaram por uma dogmatização de uma doutrina escatológica, mas isso não significa dizer que os primeiros cristãos não cultivassem esperanças escatológicas. A própria Igreja primitiva aguardava para os seus dias a vinda de Jesus (cf. 2 Ts 2.1[1]).

Com o passar do tempo, os conceitos escatológicos foram sendo amadurecidos na Teologia cristã, ainda que sem um consenso maior. E assim firmaram-se escolas escatológicas, sobre algumas das quais discorreremos a seguir.


Amilenismo (ou Amilenarismo)

 

            Os teólogos amilenistas, dentre eles L. Berkhof, conhecido pela Teologia Sistemática que escreveu, entendem que não haverá nenhum período literal de mil anos em que Cristo reinará sobre a Terra como Rei, seja antes ou depois de Sua Segunda Vinda. Eles espiritualizam boa parte das passagens futuríveis da Bíblia.

            A palavra “amilenismo” significa “não milenismo”, ou “não milênio”. De modo objetivo, destacam-se a seguir os postulados defendidos pelos escatólogos dessa linha de interpretação escatológica:

 

  1. Creem na Segunda Vinda de Jesus como um evento único, não havendo, portanto, duas fases distintas, como ensina o Pré-milenismo;
  2. O milênio é entendido por eles como sendo o Reino de Deus na Terra de forma espiritual, o qual, embora invisível (mas real) foi inaugurado por ocasião da primeira vinda do Senhor Jesus como o Verbo que se fez carne. Assim, esse reino continua existindo espiritualmente e perdurará até a Segunda Vinda de Jesus. Ao vencer na cruz, Jesus teria limitado a atuação de Satanás no sentido de enganar as nações;
  3. Os “mil anos”, mencionados seis vezes em Apocalipse 20.1-7, são, na verdade, um período simbólico, não exato, e representam a era presente da Igreja, que é um período indefinido, que durará até a Segunda Vinda de Jesus;
  4. A Tribulação para eles não será um período literal de sete anos, quando Deus derramará sobre este mundo diversos flagelos, mas é algo que experimentamos agora, na vida presente;
  5. Os amilenistas entendem que haverá apenas uma ressurreição geral por ocasião da Segunda Vinda de Jesus, que será para justos e injustos;
  6. O Juízo final será, portanto, para justos e injustos, e é nessa ocasião que ambos ressuscitarão. Os justos não serão condenados, ao passo que os injustos sim. A seguir, os salvos adentrarão ao Novo Céu e à Nova Terra.

           

            O gráfico a seguir é um ótimo recurso para facilitar a compreensão da posição amilenista:


Pós-Milenismo (ou Pós-Milenarismo)


    O pós-milenismo conta com teólogos como Charles Hodge e A. H. Strong, também muito conhecidos no Brasil pelas suas Teologias Sistemáticas. É um sistema muito similar ao anterior.

    O prefixo “pós” significa “após”, o que significa dizer que “pós-milenismo”, grosso modo, é o mesmo que “após o milênio". A seguir, pontos centrais defendidos pelo Pós-milenismo:

 

1.     Cristo regressará após o Milênio;

2.     Acredita que o Milênio descrito nas Escrituras é simbólico, apontando para a influência benéfica do evangelho sobre as pessoas em todo o mundo. Para o Pós-milenismo, o Milênio é um período indefinido, que perdurará até a Segunda Vinda de Jesus (que acontecerá também em uma só etapa);

3.     Assim como o Amilenismo, o Pós-milenismo entende que Satanás foi aprisionado quando Cristo morreu na cruz e que o anjo que o prendeu, mencionado em Apocalipse 20.1 é, na verdade, o próprio Cristo;

4.     Quanto à ressurreição, ao Juízo Final e ao Estado Eterno, as duas posições – Amilenismo e Pós-milenismo – assumem, em geral, a mesma postura.

 

            O gráfico a seguir nos ajudará a compreender esta linha de interpretação escatológica:


Pré-Milenismo (ou Pré-Milenarismo)

 

            O Pré-milenismo se distingue muito quanto às duas escolas anteriores. Apresenta mais detalhes relativos aos eventos finais. Ele não é uniforme, uma vez que coexistem dentro desta mesma linha de interpretação diferentes abordagens.

            O Pré-milenismo se divide em Pré-milenismo histórico e Pré-milenismo dispensacionalista. A posição deste trabalho de Escatologia é pré-milenista dispensacionalista (ou pré-milenismo pré-tribulacionista).

            O prefixo “pré” significa “antes”. O Pré-milenismo ensina que Cristo retornará antes do Milênio. C. I. Scofield, escatólogo cuja Bíblia de estudo tornou-se muito conhecida no Brasil, a Scofield Reference Bible, ou Bíblia de Referência Scofield, defende esta posição e contribuiu para difundir o Dispensacionalismo em nosso país.

            Os dispensacionalistas entendem que a Bíblia faria alusão a sete dispensações, daí o termo “Dispensacionalismo”. Scofield afirma: “Uma dispensação é um período de tempo durante o qual o homem é posto à prova em sua obediência a certa revelação específica da vontade de Deus”.

            Uma característica notória do Dispensacionalismo é a distinção que ele faz entre a Igreja e Israel, distinção que não deve ser confundida com preferência. A seguir, pontos principais defendidos pelo Pré-milenismo dispensacionalista:

 

  1. Crê na Segunda Vinda de Jesus em duas fases distintas, antes do Milênio;
  2. Acredita num período literal de terrível tribulação sobre a Terra – a Grande Tribulação –, que durará sete anos;
  3. Distingue o julgamento da Igreja do julgamento dos ímpios;
  4. Entende que a ressurreição dos justos ocorrerá por ocasião do Arrebatamento e que a ressurreição dos ímpios só acontecerá após o Milênio, no Juízo Final (essas ressurreições estão, então, separadas por um período de mais de mil anos;
  5. Entende que o Milênio é um período literal – mil anos literais – em que Cristo reinará sobre a Terra, dando cumprimento a profecias bíblicas do Antigo e do Novo Testamentos.

 

            Mais uma vez, o recurso gráfico com vistas a auxiliar na compreensão do Pré-milenismo dispensacionalista:


No decorrer deste livro, mais detalhes serão apresentados sobre os eventos escatológicos tal como entendidos pela Escatologia pré-milenista. Alguém já afirmou que os pré-milenistas fazem “uma “cirurgia textual” nas Escrituras, de acordo com o quadro já pré-desenhado por eles”.[2] Os pré-milenistas, no entanto, a isso respondem afirmando que a Bíblia oferece uma grande riqueza de detalhes sobre os eventos finais, permitindo reconhecer, definir e delimitar cada evento escatológico, fazendo assim uma exegese e não uma eisegese do texto bíblico.

            Entende-se que, conquanto Deus não tenha descortinado tudo que seja relacionado ao futuro, revelou, em Sua Palavra, o necessário e nos faz cientes dos eventos que hão de ocorrer em breve. De fato, as profecias da Bíblia se cumprem diante dos nossos olhos.

            O grande risco que se corre quanto à Escatologia Bíblica, bem como em relação a qualquer outra doutrina bíblica, é o de querer ir além do que está disponível nas Escrituras Sagradas, formando uma “teologia unicamente especulativa”, que mais traz confusão do que edificação. O conselho de Paulo aos coríntios é, assim, recordado: não ultrapasseis o que está escrito” (1 Co 4.6).

            A Escatologia Bíblica é motivo de conforto e alegria para a Igreja, e de temor e tremor, haja vista revelar fatos relativos ao juízo de Deus que há de ser derramado sobre a humanidade caída. Por isso, apeguemo-nos à infalível Palavra de Deus e creiamos em suas verdades eternas, fiéis e imutáveis, e guardemos firme a confissão da esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel(Hb 10.23), porque ainda um poucochinho de tempo, e o que há de vir virá e não tardará(Hb 10.37).


FONTE: COZZER, Roney Ricardo. Escatologia Bíblica: uma disciplina confortadora para a Igreja. Cariacica, ES: 2018.


[1] Há quem entenda que este texto seria um possível indicativo de que a igreja, em Tessalônica, vinha incorrendo num erro de interpretação quanto à expectativa sobre a vinda de Jesus, um tema essencialmente escatológico.

[2] Revista Ultimato, ano 31, nº 251, mar. 1998, p. 22.

 

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