Por Roney Cozzer
Ah, como eu amo apreciar a anatomia feminina!
Alguém já escreveu que a anatomia fica muito bem nos seres humanos, especialmente nas mulheres.
Concordo plenamente!
Como um homem muito religioso que sempre fui, e de formação muito conservadora, fui ensinado a reprimir esse impulso natural de apreciação da anatomia feminina. Mas a certa altura da vida pude perceber que o que a religião tende a fazer mesmo é emascular os homens e assexualizar as mulheres. Tudo ou quase tudo que tem que ver com a nossa sexualidade é visto como pecado: o olhar, apreciar, desejar, masturbar-se e claro, transar. Aliás, transar é o pior dos pecados.
Rompi com essa cosmovisão. Felizmente, sigo transgredindo essa forma de ver e entender a sexualidade humana! Sigo de cá, religioso sim e másculo também. Sigo sem negar meu desejo, e usufruindo dele. Mas devo dizer que essa consciência não está divorciada de claros valores éticos. Se de um lado rejeito a forma esdrúxula como a religião trata a sexualidade humana, noutra mão, não deixo de pensar nas sérias implicações de coisificar o ser humano pelo sexo.
E foi justamente por entender assim que logo identifiquei o erro nessa foto aleatória com a qual me deparei no Instagram.
Você também encontrou o erro?
Na Pós-modernidade (ou, como diria o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, na Modernidade Líquida), o consumismo transcendeu os limites do usufruto necessário de bens e de serviços e invadiu a esfera das relações humanas. Com isso, o ser humano vem sendo coisificado, transformado em objeto, em produto.
Sim, na Modernidade Líquida você pode comprar pessoas.
Quando vi o botão Ver produto logo abaixo da foto dessa linda mulher, não pude deixar de refletir sobre como as pessoas tem sido transformadas em objetos de compra e de venda nessa era líquida. E não menos preocupado fiquei com o fato de que normalizamos esses botões de Ver produto.
Tudo isso, no entanto, tem sido o caminho para a desumanização e do esfacelamento dos laços sociais sólidos, tão benéficos à formação humana e ao bem-estar emocional. Minha tese é que essa tendência de ver o ser humano como objeto e de coisificá-lo tem produzido alguns fenômenos sociais minimamente bizarros, que comento a seguir e que ainda me intrigam.
As pessoas seguem de cama em cama, mas, paradoxalmente, não tem ninguém, de fato, ao seu lado, na vida. Os homens gabam-se das gostosas que "comeram", exibem fotos delas como se elas fossem troféus, enquanto as gostosas, por sua vez, gabam-se de mostrarem suas belas bundas e curvas na internet. Me vejo, por vezes, perguntando o que se deve esperar de uma mulher que só sabe exibir suas curvas na internet e nada mais que seja sobre si, sobre seus valores, sobre quem ela é para muito além de um corpo bonito (e o mesmo vale para homens!).
Nessa "oferta" narcísica de corpos nas mídias sociais, é como se as pessoas dissessem de maneira inconsciente: "Eu te consumo, você me consome e está tudo bem". Mas será que está mesmo tudo bem? Damos conta da fatura emocional decorrente desse tipo de consumismo e de utilitarismo nas relações?
Suspeito que não.
E não caiamos no erro de pensar que a religião saiu incólume dessa tendência moderno líquida. Igrejas deixaram de ser, há muito tempo, comunidades e reduziram-se a coletividades e a eventos religiosos. A religião trata as pessoas de forma extremamente utilitária.
Líderes religiosos gabam-se do número de membros de congregações que lideram e dos prédios que construíram com dinheiro de fiéis. Pouco se houve sobre relações humanas, ação social, solidariedade que nos move em direção ao outro.
Suspeito que como nunca antes o movimento evangélico brasileiro ficou repleto de pastores que lideram rostos perdidos na multidão...
As consequências estão aí: filhos órfãos de pais vivos, mães que não são mães de fato, solidão em lugar de solitude, pessoas reféns da aparência e mergulhadas na própria futilidade, religiosidade sem sentido e sem laços, e que é alienante e que pouco tem a dizer sobre vida em comunidade.
Seguimos, assim, descartando e sendo descartados.
Frequentamos lugares cheios - cultos, festas, boates, etc. - mas estamos absolutamente solitários. Tal fato estabelece em nós uma angústia paradoxal. E as pessoas parecem não perceber que esse tipo de consumismo vai gradativamente consumindo-as...
Mas há esperança!
Penso que uma resposta possível a essa triste tendência consiste justamente em fazer o caminho contrário, buscando construir relações, fazendo amor mais do que transar, doar mais do que comprar e humanizar mais do que coisificar.
Uma tarefa não tão fácil, mas possível e também recompensadora!
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